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Sunday, June 19, 2022

Governo pode privatizar a Petrobras seguindo o mesmo modelo da Eletrobras? - UOL Economia

O governo voltou a cogitar a privatização da Petrobras por meio de um modelo semelhante ao usado para desestatizar a Eletrobras, ou seja, com uma capitalização (venda de ações na Bolsa). Desta vez, a possibilidade foi citada pelo ministro da Economia, Paulo Guedes. Se no caso da elétrica a participação do governo no capital votando teve que cair de 68,6% para menos de 50%, na petroleira, o bloco de controle estatal é menor, de apenas 50,26% das ações ON (ordinárias, que dão direito a voto em decisões da empresa).

Esse é um dos motivos que tornam viável a privatização da Petrobras por meio de uma capitalização, dizem especialistas ouvidos pelo UOL. Segundo eles, há investidores interessados e outros exemplos no mundo. Mas, diferentemente da Eletrobras, que foi privatizada quando a maior parte do setor de energia já era privado, a Petrobras ainda domina 75% do refino de combustíveis e 93% da exploração de petróleo. Há maior resistência política à privatização da empresa.

Passos já dados na privatização da Petrobras

Em 30 de maio, o Ministério de Minas e Energia formalizou ao Ministério da Economia o pedido de inclusão da Petrobras na carteira do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), o que foi aprovado em 2 de junho. O processo está com a equipe técnica do Ministério da Economia, responsável pelos estudos para definir um modelo de privatização da Petrobras.

Primeiro, a Eletrobras era monopólio verticalizado, vendeu a cadeia de distribuição, depois as cadeias de transmissão. E agora finalmente privatizamos a empresa. A Petrobras é a mesma coisa. Vendeu a cadeia de distribuição. No final, está limitada ao core business [parte principal do negócio], que é a exploração de petróleo. Aí nós podemos também privatizar e aumentar a competição.
Paulo Guedes

Venda de ativos já começou

Como afirmou Guedes, a Petrobras já vendeu R$ 243,7 bilhões am ativos após 68 transações em sete anos, desde 2015, em negócios como o da distribuidora de combustíveis BR, polos de gás, gasodutos e de campos de exploração de petróleo.

Segundo a petroleira, esse plano vai gerar recursos para pagamento de dívidas e reforçar investimentos na área que passou a ser considerada pela administração a mais importante do grupo: a de exploração de petróleo no pré-sal.

E é justamente essa parte que o atual governo quer agora passar definitivamente para o setor privado.

Modelo que pode inspirar privatização da Petrobras

Para privatizar a Eletrobras, o governo não colocou a companhia à venda em um leilão, como aconteceu, por exemplo, com CSN, ou Vale. O modelo usado na elétrica foi o de uma oferta de novas ações ordinárias que dão direito a voto. Com o aumento da base dessas ações, o governo, que tinha 68,6% das ações com direito a voto, ficou com 40,3%.

Também antes da oferta, o governo teve que aprovar no Congresso uma lei com novas regras para o setor elétrico e para a própria Eletrobras, como a golden share, ação especial que dá ao governo o poder de vetar, por exemplo, a tomada de controle da elétrica por outra empresa, ou a regra que limita a 10% o total de votos de cada acionista, mesmo que ele tenha mais de 10% das ações ON.

Para o sócio diretor e fundador do Cbie (Centro Brasileiro de Infraestrutura), Adriano Pires, que chegou a ser apontado pelo atual governo para assumir a presidência da Petrobras, o modelo de privatização usado na Eletrobras pode ser replicado. Segundo ele, esse modelo cria uma corporação, tipo de empresa que já funciona em outras petroleiras, como Shell.

Fazendo o processo com regras semelhantes às usadas na Eletrobras, com golden share e limite de votos aos acionistas para que a empresa não seja tomada por um único controlador, podemos ter uma privatização da Petrobras.
Adriano Pires

O que precisaria para privatizar a Petrobras?

Diferentemente da Eletrobras, cuja participação do governo no capital votando era de 68,6%, na Petrobras, o bloco de controle estatal detém apenas 50,26% das ações ON. Em número de ações, o governo controla 3,74 bilhões de ações ON, enquanto outros investidores possuem 3,701 bilhões de ações ON.

Se o governo fizer uma oferta de apenas 39 milhões de novas ações ON da Petrobras, isso já seria suficiente para o Estado brasileiro deixar de ter mais de 50% das ações com direito a voto na petroleira.

Considerando o preço de fechamento da ação na última terça-feira (14), de R$ 32,70, uma oferta da ordem de R$ 1,3 bilhão apenas bastaria para que o governo deixasse de ter mais da metade do bloco de controle da companhia.

Muito menos que o lote de 628 milhões de ações ON que o governo vendeu para reduzir a participação na Eletrobras abaixo dos 50%, em negócio que movimentou R$ 29 bilhões na oferta base, sem contar os lotes extras.

É um modelo viável. Haveria interesse de investidores no processo. A principal vantagem seria acabar com o maior risco que a operação carrega hoje, que é o controle estatal.
João Daronco, analista da Suno Research

Oferta seria maior

Analistas de mercado afirmam que a oferta básica para o governo privatizar a Petrobras tenderia a ir muito além desses números mínimos acima por dois motivos, pelo menos.

A Petrobras já tem predominância grande de investidores privados no capital total e, na parte de ações ordinárias, o governo tem algo em torno de 50,3%. É diferente da composição da Eletrobras, em que o governo tinha quase 70%. Mas se for algo parecido com o modelo da Eletrobras, a operação deverá ser bem maior.
Matheus Spiess, analista da casa de análises Empiricus

  • Valor de cada ação: Só o anúncio do processo de privatização da Petrobras já atrairia investidores interessados nas ações da empresa. Assim, a ação ON se valorizaria antes mesmo da oferta.
  • Lote maior de oferta: Uma oferta de capitalização para privatizar a Petrobras seria aproveitada também para atrair mais recursos para a companhia.

Apesar da expectativa de transição energética com aumento da participação das fontes de energia renováveis, é provável que ainda nos próximos 30 anos o petróleo sejá a principal fonte de energia disponível. A Petrobras, por causa do pré-sal, é opção muito interessante para investidores globais, grandes petroleiras ocidentais com dificuldade em avançar nas áreas geopoliticamente conturbadas e grandes fundos soberanos de países exportadores de petróleo.
Luiz Fernando Araújo, CEO da Finacap Investimentos

Vantagens da privatização

Os defensores da privatização da Petrobras dizem que o processo geraria concorrência, atrairia mais investimentos para petróleo, gás e combustíveis e até fortaleceria os órgãos públicos responsáveis pelas regras e fiscalização desses mercados.

Eles destacam que, mesmo com a privatização, o Estado brasileiro continuaria sendo o maior acionista individual, mantendo assim uma boa participação na distribuição dos lucros da petroleira.

Dos R$ 48,5 bilhões que serão distribuídos pela companhia como dividendos relativos ao primeiro trimestre do ano, por exemplo, a União ficou com cerca de R$ 14 bilhões.

A Petrobras deixará de ser usada como instrumento eleitoreiro, poderá investir de forma mais eficiente que hoje e assim permitir que o país gere mais riquezas. Para o setor, o importante é ter um governo que seja bom fiscalizador e regulador. E com a Petrobras privatizada, os órgãos reguladores terão maior independência para atuar.
Adriano Pires

Desvantagens da privatização

Os críticos da privatização da Petrobras dizem que esse modelo vai reduzir a capacidade de planejamento estratégico do país nos setores de energia, óleo, gás, petroquímico e de combustíveis. Além disso, a operação pode agravar a concentração de mercado no refino, na infraestrutura de abastecimento e na rede de distribuição de gás.

Na indústria de petróleo, as etapas de produção e de refino são distintas, mas complementares. Ao concentrar a atuação apenas na área de exploração, a empresa perde a proteção contra as variações dos preços relativos no refino ou na exploração e produção.
Ildo Sauer, professor do Instituto de Energia e Ambiente da Universidade de São Paulo (IE-USP)

Privatizando a maior empresa do setor teremos que ficar sempre reféns de incentivos privados e de isenções fiscais quando tivermos problemas com preço de combustíveis. E é justamente o que estamos vivendo neste momento.
Eric Gil Dantas, economista do Observatório Social do Petróleo (OSP) e do Instituto Brasileiro de Estudos Políticos e Sociais (Ibeps)

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